!> !> Pulmão Cabeludo
Um ser que participa do Todo e tem saudade do tempo que não foi, mas sabe que um dia nele irá se desmanchar, e flutuar. Porquanto participo da sopa divina.


























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Antigo blog do pulmao




























Pulmão Cabeludo
Alea jacus est
sábado, agosto 07, 2004
Dos direitos do homem

Ao ser humano foram dados alguns direitos invioláveis. Tão universalmente válidos que certos filósofos chamam-nos de “direitos naturais do homem”. Destacam-se, dentre eles, o direito a vida e o de propriedade. Aliás, tiro o chapéu para ambos os direitos mencionados. Tenho a convicção de que, em uma civilização culta, de espíritos polidos, a validade de tais direitos passam longe de serem alvos de polêmicas, posto serem imediatamente justos a qualquer intelecto esclarecido. Todavia, há um outro direito, preterido injustamente, e, entretanto, não menos importante, a saber, o direito à estupidez.

O direito a estupidez, ouso dizer, é um dos direitos mais básicos e importantes que existem. E à medida que o tempo passa, novas atitudes estupidas são somadas aos repertório de trilhões de bilhões de atos estúpidos já feitas em todo o mundo. E assim, sua evidência se torna mais e mais gritante e nítida.

Só um monstro poderia ser contra tal direito por este blog reivindicado. Alguém que espera de si ou dos outros algo tão simples e besta como a perfeição absoluta. Tendo este ideal em vista, o indivíduo está condenado a se julgar até o fim de sua vida não outra coisa que uma bosta, peço perdão pelo termo áspero. Sim, um bosta. Dedicará seu tempo ocioso na estranha arte de causar sofrimento em si mesmo, através da divisão da consciência em duas, uma que chicoteia e outra que recebe a chicotada.

Uma personalidade como esta une em si duas qualidades que melhor seria não misturá-los. A burrice e o estoicismo. Assemelha-se a um jegue que julga, com o poder da mente, diminuir o tamanho de suas orelhas e, não obtendo êxito, julga-se imprestável, um bosta. O ideal está errado, o método está errado.

O direito a estupidez, assim como qualquer outro direito, pode sofrer de usos abusivos. Neste caso, é a má fé que ele pode suscitar, quando o sujeito passa a ser estúpido em tempo integral.

Existem duas classes de estúpidos em tempo integral. 1) Pode ser uma máscara da canalhice, como no velho truque da mão boba. 2) Apenas é um ser adepto de ideologias que pregam uma vida em harmonia com a natureza íntima do coração, agindo de forma espontânea e dando livre vazão ao que há de mais puro em si: a burrice. Então coloquemos as coisas no seu devido modo - o direito é de ser idiota de vez em quando, e não sempre. Vejam bem, não sempre.

Assim, devemos evitar fazer idiotices, mesmo sabendo que iremos mais cedo ou mais tarde cometê-las, até o fim da vida. Assemelha-se a concepção cristã do pecado – sabe-se que irá pecar. Que fique claro, nem toda idiotice é pecado, e nem todo pecado é idiotice. Mas bom não esquecermos o que ambos guardam em comum: uma idiotice feita por você, por um amigo, por um familiar, ou pela sua namorada, deve sempre ser perdoado.

Está fora de moda ser humanista. Ao longo de minha vida conheci poucos verdadeiros humanistas. Oh! Que saudade de escutar alguém encher a boca para se gabar: "sou humanista". Já faz uma década e ainda tenho clara na memória as palavras de um velho amigo: "Sim, sou um humanista, acredito no homem, e aceito-o como ele é: mesquinho, egoísta, invejoso, fraco, perdido".




12:57 AM


quinta-feira, agosto 05, 2004

Olhar

Hoje olhei para muito mais do que costumo olhar.
E tento escrever sobre isso.
Querendo capturar o mundo com um grito.
Tarefa inútil. Inútil mundo.

Hoje, as três da tarde,
respirei gás carbônico e olhei
Os carros,
Os vidros dos carros,
Os rostos por trás dos vidros,
A alma por trás dos rostos,
E Deus por trás da alma.

E Deus, não tendo ninguém por trás,
Deu um sorriso virginal.





Estômago

O estômago digeria calado,
Influenciando o resto do mundo,
Estômago empresário,
Estômago proletário,
Estômago imenso,
Dono dos ventos,
Que sopram
A matéria fina dos sentimentos.



10:42 AM



A última vez

Talvez seja tarde demais,
Para os beijos doidos.
Talvez não foi boa coisa,
Subir a saia da morte,
E na imortal bunda branca,
Fazer rococó.



10:38 AM




Pensamento

Os pensamentos fluíam,
Tal floco de paineira
Flofando
No ar.



10:35 AM


sábado, julho 31, 2004

U-Hu!

Nhéc-Nhéc!

Eu pulo pela sala. Pulo pela sala. Ah, é diferente, é diferente, é igual, é parecido.

Já estou cantando vitória. U-hu. Vai acontecer assim e assado.

A água, quando pura, é transparente. Não é opaca, nem invisível. Algumas vezes turva. A paca, quando é transparente, não é o paca, nem é parente de ninguém. É mais do que um parente, é mais que pai, é translúcida? Trasfinita? como a consciência de si?

É isso o que quero dizer: prefiro ler do que escrever.



3:44 AM


domingo, julho 25, 2004
A semana
 
E Sábado é o dia do prazer.
Domingo é o dia sagrado do descanso.
O resto da semana é para trabalhar.

11:28 PM


terça-feira, julho 20, 2004
Reflexões sem destino
 
Um feto foi abandonado no lixo,
Depois de dois minutos seu coração,
Tic-tac-tic-tic.
Tchau, feto.
 
As coisas.
Tantas coisas.
Onde estão as coisas?
Lá fora brincando no quintal?
Dentro da nossa mente?
 
Dentro da minha mente escuto vira e mexe uma vozinha.
Ela fala baixinho, às vezes sussurra, às vezes me xinga.
E por que será que tenho o orgulho e tonto hábito de pensar que sou essa vozinha.
Eu um cogito a cogitar?
Um vozinha?! A vovozinha! (sai dessa, rapaz)
 
Mas como é difícil tapar a boquinha mucha no canto da mente.
Só quando estou no cinema é que se cala.
Ou às vezes quando escuto música. Mas é raro.
 
Vou dizer a verdade para vocês,
Minha mente é uma tagarela,
Às vezes não me permite nem ler,
Vou lendo e ela vai falando por cima.
E isso tem nome: falta de concentração.
 
Para se concentrar é preciso fazer essa voz calar a boca.
Ou ao menos fazer essa voz comentar o objeto da atenção.
Apesar desse último ser diferente do “mergulhar” em algo.  
 
Mas por que, meu caro amigo, a minha consciência gosta tanto de falar
Esse blablablá interminável?
Amanhã tem dentista.
Não se esqueça de passar no cartório.
Será que aquele filha da puta deixou a papelada no jeito.
Será que precisa de foto.
Aproveito que vou passar no banco e já bato umas fotos ali mesmo.
Até que não é caro.
Puta! Meu dinheiro ta acabando.
O que é que eu vou comer.
 
Desde criança me fascina a cultura oriental,
A arquitetura, a arte, as roupas, a perfeição, a honra.
 
Foi na Manchete,
Que vi um documentário,
Japão: a Magia do Tempo.
Mostrava uns hotéis que se pareciam colméias:
Uma cabine de um metro de largura com uma cama e uma televisão.
Achava tudo aquilo muito legal e queria ir para o Japão dormir ali.
 
Na época fazia karetê e ficava feliz quando usava quimono.
Mas não gostava muito do nome que davam para quem fazia karatê.
Karateca! Credo! Nome feio sô.
 
Os monges pregam o silêncio da mente.
Pssssss.
 
(um minuto de silêncio)
 
Os gráficos mentais tornam-se ondas,
Sem bicos sem quinas,
E é gostoso se derreter no mundo e ficar ondulando.
 
Algumas idéias trago comigo
No coração.
E às vezes quando estou mais calmo,
Contemplo essas idéias,
E elas tomam conta de mim.
E sinto espasmos e tremores.
(geralmente não é bom contar para os outros essas idéias)
 
Sou um pedaço do mundo.
 
Quando penso é o mundo que está pensando.
Todo pensamento é um pensamento do mundo.
Quando a baleia pensa é o mundo que está pensando.
 
Não estou separado. Não estou isolado. Não estou só.
 
Meu pescoço se estica um metro para cima.
Minha boca se abre como nunca abriu.
Só para gritar, com toda a força,
Por um transbordar de felicidade:
 
Sou um pedaço do mundo.
 
Feito de barro de ar de fogo e outros elementos.
 
Agindo e reagindo,
Como a pedra,
Como o iodo,
Como a cadela da vizinha.
 
Todos os pensamentos são os pensamentos mundo.
O mundo pensa muitas coisas ao mesmo tempo. Mais de um bilhão de coisas. 

Um amigo me mostrou certa vez que conseguia pensar em 9 coisas ao mesmo tempo.
Era seu máximo.
Pensava em duas músicas, quatro pessoas, um princípio filosófico e não me lembro os outros pensamentos.
Mas de costume pensava em duas ou três coisas ao mesmo tempo.
 
Pensar em nove coisas ao mesmo tempo é difícil, concordo.
Eu mesmo só consigo pensar em cinco coisas ao mesmo tempo.
E só depois de treinar muito,
E pensamentos fáceis.
Mas não pensar é bem difícil também.
 
Não estou separado do mundo.
Confundo-me com o mundo.
 
Acho que foi Ortega,
A circunstância faz parte da pessoa.
Às vezes estou parado e começo sem querer a pensar em posts.
Cinco anos atrás isso não me acontecia.
Agora acontece e é isso.

11:44 PM


sábado, julho 17, 2004
Visitar a fazenda no interior do Mato Grosso do Sul é como visitar outro mundo.

Tínhamos acabado de jantar e o capataz discorria sobre cavalos. Eu só entendia metade do que ele falava, como se ele usasse outra linguagem.

E de fato usava outra linguagem. Seu vocabulário era mais vasto do que o meu, muito mais vasto, ao menos no que se refere aos fenômenos do campo. Era tão difícil entendê-lo quanto entender Heidegger ou qualquer economês. Já li o Grande Sertões Veredas e garanto que é bem mais fácil entender a linguagem de Guimarães do que a linguagem do capataz.

Ah, é bom reafirmar que o capataz não era tonto, e se comunicava apenas por monossílabos como em Vidas Secas. Era esperto e sabia um monte de palavras por causa de sua profissão. Em suma, seu vocabulário era adequado ao seu trabalho.

Algumas expressões:

"O boi está tocando de roda"
"A égua está viciada"
"A buchecha da vaca"

Ás vezes, porém, não era uma questão de linguagem, mas uma questão de percepção associada à linguagem. Explico-me: o reconhecimento do fenômeno está associado ao ato nomeá-lo. O peão percebia reconhecia o sentimento da vaca tão logo batia o olho no animal. Eu, do meu lado, sentado no cavalo, entendia aquilo com a profundidade com que ele entenderia um computador. As vacas, para mim, mal se diferenciavam pela cor. Talvez a única diferença visível era a ausência ou presença de chifres.

Ele conhecia cada boi ou vaca, os quais tinham para ele uma personalidade bem nítida, quase idiossincrática. Apontou-me um garrote, no meio de outros cem iguais a ele, e comentou orgulhoso que semana passada o bicho havia varado uma cerca e tinha ido para o pasto das vacas. E qual foi meu espanto, escutadar dele, durante o jantar, que japonês era tudo igual. E diga-se que, por japonês ele abarca o de chinês, o coreano, o esquimo. Japonês é tudo aquilo que tem olho puxado.

Descobri com ele que havia cavalos mais inteligentes do que outros, que não aprendiam nunca, eram burros mesmo. E essa estória de que Deus equilibra nas criaturas as qualidades é uma besteira. Há cavalos que são bons em quase tudo, e outros não prestam nem para puxar charrete. Pensei em argumentar que os cavalos que "não prestam" talvez fossem mais felizes, mas o bom senso não me permitiu fazer esta consideração tão idiota.

Na verdade, concordo com capataz. O que iguala os seres de uma mesma espécie não são o equilíbrio das qualidades. Mas a morte, que vem para os felizes e os infelizes, para os pobres e os ricos.

3:48 PM


domingo, julho 11, 2004
Fazenda

Adeus, essa semana estou fora, vou para a fazenda, um lugar repleto de galinhas das mais variadas e terríveis espécies. Irei encará-las sem medo.

Não sei se é a hora certa. Mas devo contar uma verdade terrível aos paulistanos e toda a sorte de metropolitanos. Recomendo os de alma mais sensíveis a sair agora deste blog. O frango é a galinha depois de morta. Sim, a hedionda galinha, aquele animal asqueroso, assustador.

É pra carne ficar mais macia é mais gostosa que cortamos fora o saco dois bois jovens. Meu pai acabou de me dizer que têm umas duzentas cabeças de gado pra caparmos. Que bom, haverá churrasco de bago! Depois de passar o dia inteiro capando irei ler, à noite, cheio de afetação e frecura, Jane Austen, Pride and Prejudice. É um ótimo livro, agradeço Mr. Silva pela sugestão.




4:16 PM



Do relativismo

Um relativista é um sujeito absolutamente idiota. A verdade não é relativa.

Existe ao menos uma verdade incontestável, absolutamente verdadeira para qualquer um, em qualquer época, e continua sendo verdadeira mesmo que vá pra pindaíba o último ser humano. Eis: "Alguma coisa há".

Nem que seja a ilusão, os sentidos, a dúvida, as sensações, o pensamento, ou o bidê. "Alguma coisa há". Podem espernear, podem arrancar os cabelos, mas alguma coisa há.

Abaixem a cabeça e engulam essa verdade, seus relativistas duma figa. Essa verdade é o ponto arquimédico do filósofo brasileiro Mário Ferreira dos Santos, em sua obra Filosofia Concreta. É evidente que este ponto arquimédico é mais robusto, por exemplo, do que o cogito descartiano, resumido na máxima: "Penso logo existo".

Se você aceita esse axioma, "alguma coisa há", então você necessariamente terá que aceitar como verdadeira cada palavra dos três livros de sua Filosofia Concreta. Não é por acaso que Olavo de Carvalho toma o Ferreira como um dos maiores pensadores da língua Portuguesa.

Lógico, os brasileiros, conhecendo-se a si próprios, tem o saudável hábito de desconfiarem de si, preferindo importar modelos teóricos. Estão certos, mas, digo, esse caso é uma exceção. Mário Ferreira é a própria inteligência encarnada. Seu estilo não é lindo, não tem aquele floreios do rococó, que os vulgos tanto amam, mas é o estilo da verdade. Seco e exato.



3:41 PM


quinta-feira, julho 08, 2004
A névoa dos seres

Andava descalço no meio da cidade morta. Seus olhos fixados no asfalto cinza e suas sobrancelhas contraídas. Buzinas distantes lembravam a existência de vida. Ratos voadores rondavam em círculos ao redor da lua, projetando sinistras sombras nos prédios desolados. Um cachorro doente de raiva arremessava-se contra as grades.

Os contornos do dia anterior borravam na memória. O mar. O demônio. O sangue. Seria mesmo Cristo andando na superfície azul do Mar?

Dez quilômetros depois seus órgão se separam. Seu estomago, desistindo de tudo, pega a primeira canoa. O crânio estoura e o cérebro, liberto da carne, flutua numa cápsula transparente, trespassando a estratosfera. Os olhos na massa cinzenta como cerejas no sorvete. O pulmão, expandindo, beija a parte mais volátil do ser.

Dez dias depois surge a grande peneira. Filtrando a luz, os planetas e a mesquinhez. O cérebro não passa pelos poros da peneira. Carne moída é o que sobra do estômago, para a felicidade dos animais devoradores de cadáveres.

Nos fins dos tempos, numa sala branca, asséptica, o cérebro foi transferido para o liquidificador. Depois de tornar-se pasta, passa por um processo de depuração gradual, até sobrarem algumas gramas de amor em estado puro, que será posto em pequenos frascos de cristal.

Cristo andava pelo mar, e deus sustentava-o com barbantes invisíveis.

4:15 PM


quarta-feira, julho 07, 2004
Legumes

Hoje resolvi ir ao mercado, precisava de alguns legumes para o almoço. Adoro legumes. Quando eu como legumes, me sinto bem. Não posso explicar perfeitamente o que é se sentir bem.

Perfeitamente, talvez, eu não consiga explicar nada. Sempre penso na hipótese e na contra hipótese. Avalio qual é a melhor. Muitas vezes acontece de não conseguir decidir qual é a melhor.

Vou comprar legumes, sei disso. Mas antes de tomar tal resolução, pensei se não seria melhor fazer um belo macarrão com carne moída. Tenho carne moída dentro da geladeira, descongelar com microondas é simples. Não. Não vou comer macarrão, macarrão eu comi ontem e hoje não vou repetir. Legumes é melhor, tenho certeza. Não posso mesmo explicar ao certo porque tenho tanta certeza de que quero comer legumes, mas que tenho certeza, tenho.

Um cafezinho e um cigarro antes de ir comprar carne moída seria uma boa coisa a se fazer. Tem só um problema: acordar já partir direto para o cigarro e para o café pode ser prejudicial. Não que eu dê importância à saúde, dou importância para meu bem estar. Percebi que estava com sede. Resolvi, então, por via das dúvidas, começar o dia com a substância que eu mais confio, a água, de preferência a que habita no filtro.

Todos os copos estavam sujos. A bucha, soterrada no meio de pratos, repugnava minha mão. Então selecionei, em um instante, qual era o copo mais limpo e resolvi pegá-lo, passei nele apenas uma água e fiz minha própria mão de bucha.

Em seguida preparei o café e acendi o cigarro. Fumava e bebia o café. O café estava meio sem açúcar, um pouco mais seria melhor, mas não tive vontade de levantar para mais açúcar. Pensava em ir para o mercado. Sim o mercado. Tenho muita coisa para fazer hoje, depois que for comprar legumes. Será que vale a pena comprar legumes? Se comprá-los, terei que prepará-los e resultará que terei que comê-los muito tarde. Ainda mais, terei que os lavar os legumes e os pratos, ainda, terei todo trabalho da digestão. Digerir talvez seja a melhor parte, tendo em vista que legumes são de fácil digestão comparativamente com carne, gorduras e frituras. Mas isso não é importante. Na verdade não sei porque estava me preocupando com essas coisas fúteis. Deve-se comer pelo sabor, e a comida deve ser gostosa. Gostosa. Os prazeres da mesa são importantíssimos. Legumes com um gostoso arroizinho seria ótimo. É uma comida leve, digeriria rápido e estaria pronto para fazer o que tinha de fazer.

Era Sábado. Fui a pé a mercearia. Assim que entrei no raio de ação do velho gordo e dono que atendia comecei a disfarçar e a olhar os produtos da prateleira. Enquanto isso, ele fingia de desinteressado, com o ar de quem está ali por acaso. Assim que entrei, olhei para o chão, soltei um murmúrio assemelhando-se a um comprimento. Em seguida um pergunta veio a minha mente. Será aquele comerciante velho fazia questão que eu o cumprimentasse com gosto?

Um dia fui a sua mercearia comprar um cigarro e ele me disse que não havia mais cigarro. Perguntei ao velho gordo onde havia um outro bar que vendia cigarro, ao que ele prontamente respondeu.

Como havia dito que depois de comprar o cigarro voltaria lá para pegar as cervejas, me pediu um favor, que aproveitasse a viagem e comprasse cigarro para ele no bar, ele abateria o cigarro do preço das cervejas. Sem problemas. Depois que comprei o cigarro e retornei ao estabelecimento, entreguei-lhe o cigarro. Então olhou para mim disse “obrigado” e eu disse automaticamente “obrigado a você”, então percebi o erro na resposta. E, já louco para ir embora daquele local, murmurei, muito baixo, tão baixo que nem eu mesmo pude entender: “de nada”. Fui embora, caminhando sobre meus tênis e meus tênis sobre o asfalto.

O velho, com certeza, percebeu como eu o tratava ao dizer “obrigado a você”. Havia escapado, sem dúvida, mas são as séries dos pequenos atos que revelam as pessoas. Se escolhesse, teria falado sincera e naturalmente “de nada”. Mas não. Agora ele teria certeza que eu não me preocupava com ele, revelando nossa relação falsa de amizade puramente baseada no comércio. Era a prova final que ele necessitava, tratei-o como um bicho, como um autômato. Deixei claro que sua palavra não tinha o menor valor para mim.

Mas não éramos amigos, isso é obvio. Porém seria melhor se gostasse de mim. E eu entrasse feliz pela porta, olhasse para ele, e dissesse em alto e bom tom “bom dia”.

2:02 AM



Mulher com pinto

- E aê cara, beleza?

- Beleza.

- Tudo certo?

- Tudo em riba.

- Mas fala aê. E o que é essa camisetinha colada hein? Ah! Eu não esperava isso de você. Baitolagem hein?

- Vai se fuder. É moda, a mulherada gosta.

- Sei, sei, a mulherada de pinto, né veado.

- Isso mesmo.

- O quê?!

- É isso mesmo que você escutou, curto a mulherada de pinto. Traveco mesmo. No duro. Bem duro.

- Que isso!? Cê ta zuando na minha cara. Porra, quantas vezes agente saímos juntos para catar a mulherada e você vem agora com essa. Era o que faltava. Cê tá zuando. Fala sério.

- Não, meu! Caralho! Puta que pariu! Quem disse que é errado dar a bunda para uma mulher com pinto. É proibido por acaso?

- Não porra, cê não tá entendendo ou tá dando de João sem braço. Pega mal. Eu mesmo me sinto mal. Sei lá. Pensar que saímos tantas noites pra catar a mulherada... e de repente, todo esse tempo, você jogava no outro time.

- Quem disse que eu jogo no outro time? Isso é conclusão sua.

- Porra, você mesmo disse, cara. Você me disse que gostava de mulher de pinto.

- É isso mesmo, mas não gosto de homem. Não gosto de dar o meu boga para gay, bofe, michê, nem para bicha americana de bigode e roupa de couro. Definitivamente não. Gosto é de traveco, para falar tecnicamente.

- Tecnicamente?

- Isso. Na hora você nem pensa que é um homem, é mais uma mulher com uma pequena tromba ao invés da buceta. Necessita de muita capacidade de abstração para se concluir que aquilo é XY, homem.

- Tudo bem, vamos resumir. Quer dizer que você continua igual? Só mudou esse pequeno detalhe? Então me fala: e de mulher sem pinto, continua gostando?

- Porra! Pra caralho!

- Que bom. Então vamos catar umas putas?

- Agora.

Nisso, os dois amigos, resolvidos os desentendimentos, foram atrás das putas. Um deles pegou uma puta morena, bem rabuda. O outro pegou uma puta loura dos seios pequenos e bicudos. Foram para a mesma casa e ficaram no mesmo quarto. Se empaturraram de Whisky barato e pediram para as putas se lamber e fazer estripe.

Após dar umas palmadas estraladas na bunda das vagabundas, Dioguinho começou a comer o rabo da morena. O outro, por sua vez, pediu a loura que enfiasse um cabo de vassoura em seu rabo. Nisso, Dioguinho, enquanto comia a puta, já com o suor a escorrer pela testa, virou o rosto para o lado e, reparando no pedido do amigo, disse, num misto de decepção e represália:

- Porra cara! Que isso meu, que coisa horrorosa. Come essa puta direito.

- Porra cara. Não tem nada demais...é só um cabo de vassoura...tá bom.

Então Vilela, pois o nome dele era Vilela, pediu para a puta enfiar o peito bicudo no cu dele.

- Enfia seu peito no meu boga.

- Não dá cara - disse a puta- Não tem jeito, eu não vou fazer essa nojeira. Escute bem: eu sou puta, mas sou honrada. Minha profissão é dar prazer aos homens e não fazer contorcionismos mirabolantes. Com isso nós passamos do limite da hiegiene. Não obstante, a consistência de meu peito, embora bicudo, não permite a concretização de seu desejo. Assim, não insistas mais. Mas se ainda assim persistir tua vontade, posso introduzir meu dedo indicador em seu ânus, enquanto rodo meu peito na região periférica de seu orifício. Talvez deste modo enganemos os sentidos. Isto, com efeito, é o melhor que eu posso fazer a fim de que você obtenha satisfaça. Bom, esta é minha opinião sobre o assunto. Desnecessário dizer que sabemos que cabe só a você a decisão final. Estou aqui para te servir, na medida em que você me pagar. Porém, lembre-se, você está limitado pelo princípio da realidade, e nem todos os seus sonhos podem vir a se tornarem realidade. Portanto, peço prudência, e digo que pense melhor antes de sair pedindo para mim qualquer coisa.

- Puta, minha amiga, suas palavras são sensatas. Deite-se e abra as pernas. Vamos fazer o clássico papai-mamãe.

Dioguinho viu o cara fazendo papai mamãe na puta loura e, apesar do tradicionalismo, ficou feliz com e por seu amigo.

1:41 AM


terça-feira, julho 06, 2004
caceta
8:16 PM


quinta-feira, julho 01, 2004
Oh!

Quando era jovem escrevia sobre legumes. Hoje, cansado que estou, sei que críticas tecidas por gente na qual não damos a menor importância não faz a menor diferença. Mas a crítica feita por alguém a quem valorizamos sempre dói no coração.

O blogger oferece certos recursos que o meu tradicional template ignora. Mas estou apegado a ele e as suas cores pulmonares. Continuarei até talvez algum dia mudar, como mudam as borboletas do meu jardim.

Uma pessoa que anda quilometros só para bater a porta de minha casa e dizer palavras ásperas ou "jogar verdades na minha cara" só pode ser alguém me estima muito além da medida razoável. Geralmente faz partes da tantas bichas enrustidas e invejosas existem por aí.


2:10 AM



Feliz aniverário

Jô, meu amor,

Hoje você completa a sua vigésima sexta volta em torno do Sol. E neste dia especial quero te dizer o quanto te amo e o tanto que você é importante para mim. Sinto um certo receio, rude que sou, de minhas palavras não transmitirem o que sinto. Seus lindos olhos são suficientes para mostrar ao meu tosco coração o tanto que é bom o amor.

Você reina em meu coração, linda e majestosa. É muita sorte a minha ter encontrado neste planeta alguém com quem compartilhar verdadeiramente minha felicidade e minha tristeza. Sinto-me tão próximo de você, que mesmo longe sinto o calor de sua presença.

Você percebe-me melhor do que ninguém. Entrevê os meus demônios e mesmo assim fica comigo. É que quando estou do seu lado, não dá nem duas horas e meus demônios já estão dormindo. É uma pescadora hábil que fisga em mim a carpa da felicidade. Eu nado em seus sorrisos, passeio pelo seu silêncio, me afundo em seu mistério, me inebrio na sua beleza, me perco na suas curvas, delicio-me com seu cheirinho.

Minha fenícia deslumbrante, eu te amo, e te quero bem, muito bem mesmo.

Multiplica o que eu disse por vinte e seis e encontrará a verdade.

Uma galáxia de beijos.

1:16 AM


quarta-feira, junho 30, 2004
"Wunderblogs ativar!"

Em breve haverá lançamento do livro dos wunderblogs. Os cavalheiros e as damas esperam ansiosos pelo lançamento. Não exagero: no dia 5 de julho inaugura-se uma nova fase na literatura brasileira.

O post, célula formadora do blog, não pode ser categorizada nem como crônica, nem como poesia, nem como material de confissão . Sua essência é a liberdade. O post pode ser uma frase, um verso, uma genuflexão, pode contar com figura, pode ser uma única figura.

O post tem uma liberdade sem par na história da literatura, da arte, ou da comunicação. Não precisa de uma filosofia que o justifique tal como a arte pós-moderna. Essa liberdade também desfruta o próprio blogueiro. Compara-se a um jornalista dono de seu próprio jornal. Isso por uma razão simples: o baixo custo econômico de manutenção de sua página na Internet.

O resultado é que o blog tem o rabo liberto dos punhos daquele leitor que costuma ficar bem no meio da gaussiana. E não é por acaso. Esse ser medíocre por excelência representa o leitor ideal dos meios de comunicação em geral, o jornal tem a obrigação agradar para não falir. Já o blog pode ter o prazer ou o luxo de vir a agradar, mas nunca a obrigação, eis uma das grandes diferenças.

Dessa falta de comprometimento e de obrigação segue que o blog torna-se uma das expressões máximas do homem contemporâneo, do indivíduo, no sentido forte do termo. Dentro de um blog, encontramos o ser humano com suas particularidades, debatendo com a mídia, com seu mundo. E outras vezes abandonando o mundo e mídia para apenas dar risada e viver bem, no espírito da bossa-nova, leve, risonha e feliz, pois como bem sabem os wunderblogs, o indivíduo é mais do que um coágulo ideológico.

E não se encontra entre eles, como acreditam os jumentos, uma uniformidade de idéias, de gostos, de posições políticas, de assuntos, de tonalidade emocional. O que os une são uma afinidade muito sutil que não consigo entender direito.

Quando a criatura humana, tempos atrás, em um belo dia de sol, provou do fruto proibido, descobriu a diferença entre o bem e mal. Desde então existem comidas boas e ruins, livros bons e ruins, músicas boas e ruins. Da mesma forma são os blogs. Por não se prender a nenhuma forma pré-estabelecida, a nenhum cânone, o blog está para seu escritor assim como a árvore está para a fruta, ou a comida para o cozinheiro. Uma árvore ressecada não dá frutos.

Mas lembremos: comendo a fruta não se deduz o sabor da árvore, da mesma maneira que, ao se comer o cozinheiro, não se adivinha o sabor de sua comida. Mas sem a árvore não haveria a fruta, e sem a fruta o cozinheiro. Enrolei-me, passemos adiante.

Segunda feira haverá a inauguração do livro dos wunderblogs e um novo tempo na história da literatura. Imagino daqui a cem anos nas salas de cursinho. Continuarão ensinando Alexandre Herculano, e referindo ao seu estilo como "solene". Mas acrescentarão nas apostilas os wunder, como os patriarcas de um novo gênero, o post. Serão também os arautos de um novo mundo, de uma exitência mais feliz e melhor, com menos rancor e mais amor.

Eis:

wunderblogs




9:12 PM


sexta-feira, junho 25, 2004
O nome de Severino de Jesus pairou pela cidade como o maior defensor do bidê em solo brasileiro. Sua fama, que mais tarde viria a tomar proporções mundiais, teve início em meados de oitenta, quando ainda proclamava pelas ruas da cidade a utilidade do aparelho. E foi numa destas ruas que o encontrei, pela primeira vez, quando atravessava, após um árduo dia de trabalho, a praça quinze. Vi uma multidão disputando a ombros o melhor lugar para ver, lá na frente, um sujeito moreno, camisa social, o dedo erguido para o céu num gesto de eloqüência conscientemente contida. Versava o sobre bem viver.

“Meus amigos, o bidê não é objeto de luxo como pensam os comunistas. Nem um simples bem de consumo como qualquer outro, tal como pensam os capitalistas. Não, definitivamente não. O bidê é um objeto sublime. Vejamos o esplendor de suas curvas, o brilho fosco do azulejo bem temperado, seu contorno arrojado, sua cor marota. Mas acima de tudo, levemos em consideração sua utilidade prática.

A humanidade ficará eternamente agradecida pela inauguração de uma nova era em que o homem terá queimado o último papel higiênico. Sem dúvida, alguém que ama a si mesmo é alguém abomina o papel higiênico.

E não podia ser de outra maneira. O homem que do papel higiênico faz uso exclusivo é um ser atormentado. Se os grandes monstros da história desfrutassem do bidê a história seguiria por caminhos mais doces. Mussolini largaria tudo para se tornar pugilista. A Alemanha de Hitler seria hoje um jardim de variadas flores.

Mas o pior tipo, o ser mais raivoso, é aquele que, não bastasse o uso do papel higiênico, ainda usa o cor-de-rosa, aquela lixa desumana. Sinto asco só de pensar na imoralidade daquele objeto horrendo, que não absorve nada, e vêm traumatizando centenas de milhares de almas sensíveis. Não é concebível que o homem em sã consciência o use ao seu bel prazer. Só sob o jugo do opressor ou pelo descontrole da razão, um cidadão médio o tiraria da prateleira do supermercado para botá-lo no seu carrinho.

Com efeito, o papel higiênico é mais vezes utilizado como técnicas de auto-massacre. Tem-se notícia que, para se redimir de seus hediondos atos criminosos, Stalin usava-o freqüentemente em acampamentos na Sibéria. E a ciência nós diz que o uso do papel higiênico rosa em crianças vêm a contribuir para o homossexualismo futuro, bem como o uso dos papéis higiênicos aromáticos, com especial atenção aos de pêssego, morango e cereja.

Oh! Meus amigos, não sigam o torpe exemplo dos acadêmicos, que usam suas teses como produto de limpeza. Não! Deus quer bem daqueles que amam seu fiofó. Vejam por exemplo, Pardinho: nunca usou papel higiênico, mesmo no tempo que ainda era roceiro do triangulo mineiro. E eis o segredo da elegância e do bom humor desse ilustre homem: ninguém ama mais a vida do que o homem que faz bom uso do bidê.

Quantas horas de prazer e relaxamento a humanidade não teve em cima do bidê? Mas esse quadro vem mudando a cada dia que passa. Os grandes banqueiros mundiais, após Breton Woods, em sua temerosa tentativa de controlar o mundo, vem diminuindo em doses homeopáticas o valor do bidê na mídia e nas instituições globais. Ato espúrio que escandalizaria todo o séc. XIX. Nunca o bidê foi tão badalado quanto na “belle époque”.

Os argumentos não chegariam ao fim. Que seja gravado na superfície da lua: o homem sobre o bidê é um homem satisfeito. Para ele, a ambição do poder e o fogo da luxuria não lhe consome a mente. Está longe, tão longe do pecado quanto um condor em pleno vôo está dos seres rasteiros e vis que serpenteiam sorrateiros pela terra. A criatura sobre o bidê é quase divina: nela não se encontra nenhum mal. É pura bondade, é pureza, é perdão. Ninguém sente tão profundamente a alegria de viver. Esta em paz, como o Cristão exemplar.

E por que a humanidade tem desprezando o bidê? Simplesmente o bidê é uma ameaça ao status quo. Tentam tapar a boca ao bidê nos meios de comunicação devido à estrondosa revolução mundial que sua justa valorização acarretaria.”

Neste momento, o nosso grande orador faz uma longa pausa e, enchendo o pulmão de ar, como se juntasse forças para lançar ao mundo a idéia que viria a ser a ruína dos pilares da civilização ocidental:

“O bidê, portanto, é infalivelmente o novo substituto da cruz. Isto não implica, evidentemente, no desmerecimento nem do bem nem do Cristo. Pelo contrário, Cristo, sentado sobre o bidê deveria ser grande símbolo dos altares. Algumas gravuras teriam cristo conversando com seus apóstolos, todos eles também sentados em bidês. Teriam os olhos calmos e serenos, discorrendo, no frescor da inteligência, sobre unidade indivisível da santíssima trindade.

Certamente estou ciente de que o bidê, sendo uma invenção moderna, não pertence ao texto bíblico. O mais próximo que se pode chegar dele é o riachinho da aldeia, matéria prima de todo batizado: intuição genial que antevia, dois mil anos antes, a existência do bidê. O elemento que lhes dá união sob o signo da purificação não podia ser outro: a água.

Em nossa nova perspectiva cosmológica e moral, os dois grandes extremos metafísicos são, portanto, o bidê e o papel higiênico rosa. Lógico que refiro ao bidê ideal, tendo em vista a grande diferença de qualidade entre os bidês reais. Do mesmo modo como alguns ignorantes possuem coleções de livros como objeto de decoração, alguns sujeitos, querendo afetar bom gosto, instalam, em seus banheiros, lindos e pomposos bidês, com válvulas douradas e cordões reluzentes. Mas são logo desmascarados pela prática, ao experimentarmos o jato de água se projetar em cone, molhando toda a bunda sem molhar o essencial. Tive o horror de conhecer bidês cuja pressão da água era insuficiente mesmo para se fazer o digníssimo ato de lavar a bunda. A água apenas respingava, muito de leve, sem causar grandes efeitos que não fossem pequenas cócegas.

Não interessa se esses falsários são novos ricos ou não, o que interessa é que a instalação de um bidê não implica em sua utilização.

Nesse instante, os ouvintes estão estupefatos. Permanecem em silêncio durante certo tempo até que toma lugar um alvoroço de vozes. As pessoas na rua expõem suas dúvidas educadamente para seus companheiros, enquanto outros arriscam dirigir sua palavra ao mestre. Súbito, um homem gordo e de bigodes se lança sobre a multidão. Com voz poderosa apresenta o seguinte dilema:

“E quanto ao bidê de mão?”.

“Sim, o bidê de mão é constituído por aquela mangueirinha ao lado da privada, certo? Bom, a sua utilização é, de modo geral, mais desconfortável que o bidê normal, embora apresente algumas vantagens, como o direcionamento manual do jato d’água. Contudo o defeito reside no fato de que a força da pressão do jato d’água não poder ser regulada senão de forma tosca, através do afastamento manual da fonte de água, o que, convenhamos, é coisa mais de um troglodita que de um uma criatura delicada. Mas devo admitir que, embora represente um mal gosto, é perfeitamente aceitável alguém de saúde mental intacta preferir o jato de água manual ao clássico bidê”.

Um estudante de psicologia ali presente, depois de ter feitos comentários repletos de sorrisinhos irônicos para suas amigas, lança ao mestre esta pergunta, com ar de garoto inteligente e bacana da facú:

“Alguém que usa bidê com freqüência tem a propensão de se tornar homossexual?”.

“Não. Pelo contrário, o bidê alivia a tensão da alma e do corpo. E o homossexualismo nada mais é que um modo de aliviar estas perturbadoras tensões que nos afligem cotidianamente, como agulhas fincadas espinhas e nuvens negras ofuscando a clareza da alma. É, entretanto, o modo mais grosseiro, doloroso e desnecessário de se escapar ao mal.

Nesse momento o grande mestre, numa incontida exultação, começa a distribuir estas palavras:

Ah! O bidê é confortável! Refresca no verão e aquece no inverno! É por isso que o gay o é apenas porque o desconhece. Aliás, usa o bidê sim, mas o bidê errado, de forma errada, na hora errada. A base do erro é que tomam sua prática como meio, como instrumento, função, método, e nunca como fim em si mesmo. E ele se basta, eis o sentido mais pleno do bidê.

De fato, um dos preconceitos dolorosos do mundo hodierno, e que se faz passar desapercebido, diz respeito ao reducionismo do bidê às suas funções higiênicas. Este mal tem origem, sem dúvida, com o advento do racionalismo, corrente de pensamento que, por acreditar no poder ilimitado da razão, subordina o bidê a uma escala de valores na qual a privada sai triunfante, como a detentora de todos os louros. Não há idiotice maior que esta.

Por isso, na linguagem simbólica de Avanhandava a privada designa as forças racionais e civilizatórias. Enquanto que o bidê, em contrapartida, é o correlato da elegância.

A privada tem hora marcada pelo relógio da necessidade. O Bidê não. Por isso o bidê também é representativo do livre-arbítrio, da porção sublime do homem. Foi criado para ser usufruído a qualquer hora, bastando, para isso, querer. Existe algo mais gostoso do que acordar, escovar os dentes e ir logo para o verdadeiro trono? Atravessando, deste modo, com o barco do devaneio, o lago indiscernível cujas águas separa o sonho da realidade e a realidade do sonho? O bidê é o verdadeiro alimento da alma e seu principal meio de ascensão: não a música, não a dança, não a arte, mas o bidê, e tenho dito."


6:00 PM



Fui inspirado por um post a mudar. Resolvi mudar de template, para não mudar de nome. Mais tarde, que sabe, eu não mudo de sexo.
2:50 AM



Pulmao Cabeludo segurando um pacu
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2:18 AM



Na passada eu vi um pacu em cima da mesa.

Na quinta feira assei um pacu de dois quilos e meio aqui na minha casa. Recheei a parte interna do peixe de farofa com couve. O pacu, o grande pacu, passou duas horas no fogo brando. É um peixe muito gorduroso, necessita tempo para ficar sequinho. E justamente por ser gorduroso que o pacu é conhecido, pelos meus amigos, como a picanha dos peixes. Se vocês estivessem aqui em casa, poderiam ter certeza: estava bom mesmo. O pacu, de fato, é muito saboroso, é um peixe de rio e tem as características típicas de um peixe de rio. Quem gosta de peixe de rio, do seu inconfundível sabor de barro, nunca nega um pacu. Entretanto, o sabor da costela do Pacu é mais suave que o sabor da cacunda.

Como tempero opcional, preparei um molho a base de shoyo e gengibre ralado, que você podia jogar por cima do peixe.

Não é necessário dizer que não faltaram as piadinhas: “Vamos comer o pacu do Pulmão”, etc.

Quando a assadeira aterrizou na mesa, todos salivaram. Estava lá o pacu, todo oferecido, com sua carne tenra. Depois do pessoal ter provado e aprovado vieram os elogios e as perguntas sobre a receita. Responder a essas perguntas é sempre divertido. No fundo é tudo muito simples, mas é quase uma ofensa dizer que é simples.


Disse, como quem compartilha um segredo, que tinha feito uma pesquisa nas peixarias de Ribeirão e que aquele Pacu, sem dúvida, era o melhor que eu havia encontrado, tinha vindo do Pará (isso é verdade). Nessa hora todos se impressionaram, ninguém esperava que alguém pudesse se preocupar da procedência do Pacu.

O pacu tinha dois quilos e meio, tamanho ideal para o Pacu (nunca compre um pacu com mais de três quilos, ou com menos de um quilo).

Depois disse que havia investigado o peixeiro sobre o processo de conservação do peixe. Disse com tamanha seriedade, que pareceu a todos a coisa mais óbvia do mundo esse cuidado. “A qualidade dos ingredientes é a alma da cozinha” – uma voz retumbou triunfante na mesa, para mostrar entendimento. Todos concordaram.

O que achei mais insólito, na verdade, foi o próprio peixeiro e sua figura. Era um tipo engraçado, parecia o Agostinho da grande família. Disse-me que seus peixes passavam por um tubo de congelamento que fazia com que o peixe, em meia hora, já estivesse congelado. Depois, falou mal das outras peixarias, sobretudo do Carrefour, em que se encontram aqueles peixes que ficam no gelo. Confidenciou-me, já com uma certa intimidade, que os peixes do Carrefour são de cativeiro, o pessoal usa hormônio, e ainda uma substância que espirram no peixe para conservá-lo. “Três dias no gelo, meu amigo, você acha que um peixe agüenta isso?” Já o seu peixe não, vinha do Pará. A certa altura, o peixeiro estava tão empolgado com seu próprio discurso, que começou a relatar a procedência de cada um de seus peixes, abrindo o freezer e me mostrando um por um. Piapara do Rio Grande, piraputanga de não sei da onde, corvina, filhote, tambacú, dourado.

Diante desta situação, senti uma fagulha de orgulho: o peixeiro tinha-me como um grande conhecedor de peixes. Então, ensaiei uma cara séria de entendido em peixes, ou pelo menos de um apaixonado pela pescaria, e comecei a gastar todo o meu conhecimento no assunto, arriscando palpites e comentários:

“Realmente, hoje em dia está difícil pescar no mato-grosso, a pesca predatória está acabando com os peixes da região. Há dez anos atrás, que beleza!”. (Depois fiquei preocupado, minha idade aparente não me permitia falar nem de sete anos atrás).

“Tem dourado aí? O dourado é um peixe delicioso, pescá-lo então é uma beleza! Ô peixe brigadô!”.

Depois, discutimos sobre a receita do caldo de piranha, e o problema dos espinhos. Mas para frente já compartilhamos daquele ar confidencial dos amigos de longa data ao discutirmos sobre a validade ou não do coentro na moqueca.

Mas não sei se era exatamente isso que eu queira falar, meu plano era falar sobre a arte de vender o peixe, uma das artes mais importantes de que tenho notícia.

2:01 AM


quinta-feira, junho 24, 2004
Nunca
3:11 AM



Bunda boa.
2:21 AM


quinta-feira, junho 17, 2004
A psicologia dos Pré-Socráticos

Uma pessoa que gosto muito disse-me que se eu continuasse escrevendo sobre certos assuntos eu acabaria tendo-me como único leitor.

É triste. Gostaria de ser muito popular, amado por todos. Gostaria que uma multidão de gente me esperasse no aeroporto, com faixas dizendo que amam e me adoram. Mas enquanto isso não chega, fico aqui, em casa, a pensar sobre a psicologia dos pré-socráticos.

Falar de Pré-Socrático está na lista negra, só me levará ao anonimato. Mas, de vez em quando, sou tomado por forças estóicas a seguir o caminho da verdade, e devo admitir que praticamente desconsidero todo conhecimento filosófico de Sócrates para frente, incluindo Nietzsche.

Não é à toa que gosto tanto, estudei muito para chegar aos pré-socráticos e perceber o tanto que é verdadeira, por exemplo, a seguinte afirmação, de Heráclito:

"É prazer para as almas tornarem-se úmidas."

ou:

"A alma mais seca é mais sábia a melhor."

Não há relativismos. É de uma estarrecedora pontualidade e exatidão. Não entendo porque a FUVEST não apresenta perguntas como a seguir:

1) Qual alma é mais sábia e melhor?

a) a úmida.
b) a seca.
c) a que segue o imperativo categórico.
d) alma não existe, portanto, a pergunta não faz sentido.
e) nenhuma das anteriores.

Não devemos esquecer que é grande prazer para as almas se tornarem úmidas, o que revela que Heráclito já sabia que o caminho do simples prazer não é o melhor.

Provas:

"Na hora do prazer a gente sente a alma umidecer, e sentir a alma umidecer é gostoso, realmente. Mas logo depois dá um grande mal estar, o que os vulgos chamam de ressaca. É dificílimo secá-la novamente. Sei de um padeiro que teve sua alma tão umidecida numa noite de Carnaval, que precisou passar toda a quaresma, a água e pão, para secá-la novamente."

Juremar.

Nelson Rodrigues constata que nada como o prazer do sexo para se gerar o canalha.

E se isso não convence lembro que em The Waste Land, de T.S. Eliot, os títulos da terceira e da quarta parte do poema são, respectivamente:

"O sermão de fogo" (alusão à Heráclito: tudo é fogo).

"Morte pela água" ( o hedonismo absoluto, típico daquelas pessoas que buscam viver o hoje como se fosse o último dia, se eu vivesse assim, com certeza já estaria morto há muito tempo).



2:52 AM



Comoção

Sempre me comoverá a imagem de uma menina com vestidinho de chita de mãos dadas com um menino que acha feio amar.

Escrevo isso porque mudei o servidor da caixa de comentários.

2:46 AM



Antes, uma a cada três mulheres era viúva-moça

Gosto de pensar em certas imagens que às vezes encontro pela vida. Tem uma que gosto muito, embora consciente que ela não reverbere na alma de um homem moderno, como hei de explicar mais adiante. Refiro-me a seguinte imagem ou cena: uma mulher dançando um samba fervoroso sobre a tumba de seu finado marido.

É, sem dúvida, uma imagem forte. Nem é necessário sabermos se ela está feliz ou triste, nem o motivo porque dança. Você entra no cemitério, vai até o túmulo do morto no qual quer prestar homenagem com suas lágrimas e encontra, no túmulo ao lado, uma mulher dançando um samba fervoroso sobre o túmulo de seu finado marido, desprezando ou ignorando sua presença. É uma cena em tanto.

Sinto nesta cena o cheiro do passado, um vago odor de naftalina. Evoca um tempo em que Tancredo Neves ainda era criança e jogava peão com Raul Pompéia no Ateneu. Era um tempo muito diferente do nosso, um tempo em que se econtrava pelas ruas a chamadas “viúvas moças”. Todo mundo que leu um pouco de Machado de Assis sabe que em sua época uma cada três mulheres eram viúvas moças.

Hoje em dia a viúva moça está, digamos, tão extinta quanto o panda ou um macaco-aranha, para a infelicidade dos mancebos em geral. Repito: para e infelicidade dos homens. Nenhuma mulher tão interessante quanto a viúva moça. O olhar esquivo e seguro. Suas magníficas espáduas, sua tez áurea como o marfim, a gentileza do busto, e ainda, a herança do marido.

Mas não é só. A viúva moça, meus amigos, tem algo de fatal. Algo de deliciosamente perigoso. A sombra do defunto sempre segue seus passos, imprimindo-lhe uma aura de tragédia que a acompanha sempre e sempre a acompanhará, como uma ferida aberta que jamais cicatrizará. Sua postura imponente exala um ar de quem nunca mais amará a ninguém, embora o fogo da volúpia e do desejo, ainda arda em seu coração de moça, e a faça, vez por outra, cometer loucuras.

Oh! Quantos gatunos de carteirinha já não perderam a cabeça por uma viúva moça! Nos bailes dúzias de vítimas ressentidas fitando seu decote. E ela, desimpedida, rica, luminosa, valsando com um lindo mancebo, como se fosse a rainha de antigas Franças. Ninguém é tão livre quanto ela.

Bom, lembro que uma tia minha foi uma viúva moça, chamava-se Ana. Seu marido morreu pouco tempo depois do casamento, deixando como herança apenas um vazio no peito e uma tristeza que perdurou durante anos. Morreu de cirrose o homem, ou foi pancreatíte? Não importa, foi o álcool mesmo. Poucas lembranças tenho dele, mas são boas. Levava eu e meus primos para pescarmos e nadarmos no Lago Azul, um clube cuja atração era um lago, aliás, a única atração. O clube era o lago. Mas naquela época nós não precisávamos mais do que um lago para ser feliz. Um lago, uma vara de bambu, e a alegria de sentir a fisgada de algum lambari.

E assim minha tia encontrou-se só, numa enorme casa. A casa tinha um um vasto quintal, com uma piscina, um limoeiro, e uma parte coberta. Passados alguns anos a casa da minha tia “viúva moça” ficou conhecida na cidade pelo furor e despudor de suas festas. Nós achávamos nossa tia meio loucona mesmo, de uma animação sem igual.

Certa vez, meu primo, tentando se vingar de seu irmão mais velho, dedurou-o para sua mãe, como um pequeno Cain:-“O Júlio tem revistas pornográficas.” Nisso, minha tia Ana, que estava por perto, antecipando a reação de minha outra tia, disse: “Hum! Que gostoso! Quero ver!” Assumiu nesse dia, para o espanto de todos, que gostava de homem, no sentido carnal da coisa. Eu e meu primo ficamos chocados com minha tia, com seu despudor, com sua inclinação ao pecado.

Tia Ana foi uma das mulheres mais livres de Penápolis na década de oitenta e começo de noventa. Nem preciso fechar os olhos para lembrar-me do seu riso, aliás, da sua gargalhada irreverente e contagiante. Talvez seja exagero, mas ela é uma das poucas pessoas a que verdadeiramente posso chamar de irreverente.

Tão extinto quanto as viúvas moças estão os irreverentes. Em toda a minha vida conheci, no máximo, umas três pessoas irreverentes, todos com mais de cinquenta. Não tenho nenhum amigo irreverente, nenhum colega irreverente, ninguém. O que se tem hoje é gente podre, gente descarada, sem vergonha na cara. Muito diferente de ser irreverente.



2:41 AM


quarta-feira, junho 16, 2004

1:20 AM



O burro ao olhar no espelho vê um gênio

O crítico acredita que o que é mais importante para si o é também para autor da obra que ele examina. Parte da noção de que ele sabe o que é mais importante e que o autor, sendo tão inteligente como ele, obviamente compartilha da certeza de sua opinião.

Assim, os sociólogos encontram, ao analisarem Machado de Assis, somente denúncias sociais. Os psicanalistas, por seu turno, quando lêem sua obra, encontram somente gays, edípicos, histéricas e outras figurinhas.

Outros, como tive o horror de conhecer recentemente, buscam em seus romances e contos a má colocação do pronome oblíquo, para, deste modo, provar que Machado não é tão bom assim.

E com isso provam, única e exclusivamente, que são uns patetas. Assemelhando-se a alguém que se propõe medir o do outro para provar publicamente, com sorrisos de triunfo, que não era tão grande assim, tinha vinte e três ou vinte e dois centímetros.

Existe, aliás, uma manada galopante que, quando abre o focinho, é para tentar provar que fulano, beltrano, ou siclano de tal, não têm 25 centímetros. Já alguns animais mais delicados ganham a vida para dar a ilusão dos vinte e cinco centímetros. É o caso dos publicitários, sem exceção.

Atribuem vinte e cinco centímetros a tudo, desde que pagos para isso. São a encarnação viva de Satã. São piores que os advogados de Paulo Maluf, bem piores, e queimarão no inferno.




12:58 AM


segunda-feira, junho 14, 2004
Dialética

Os novos conhecimentos, quando filosóficos, geram novas perguntas; quando científicos, novos experimentos. E os novos conhecimentos assim obtidos, novos conhecimentos; e os experimentos, novos experimentos. Terá um limite?

Embora alguns cientístas debatam sobre o fim da física, a verdade é que ela nunca parou de se desenvolver, nem parará. O corpo do conhecimento assemelha-se a de um ser vivo, está continuamente em processo, em estado de transformação.





1:30 AM



Vida tranquila

A vida é tranquila para quem aceita, de bom coração, a morte.

1:28 AM


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